quinta-feira, 4 de março de 2021

Globo e você...

 “O povo não é bobo, abaixo a Rede Globo!” Quem nunca ouviu e, ouvindo, se não bradou junto, ao menos concordou internamente? Quem nunca usou a contração “Globolixo”? Quem nunca a acusou de manipular o povo? Finalmente, quem não dá risada e se sente vingado quando ouve falar de supostas dificuldades financeiras da emissora, chegando a desejar que seu processo falimentar não tarde?


Particularmente, eu me sinto confortável para criticar a Rede Globo. Não só porque é meu direito constitucional à liberdade de expressão, mas também porque sustento minhas opiniões a respeito com coerência há décadas, não ao sabor de conveniências. Em um breve relato, vou expor meu processo de distanciamento para, em seguida, comentar os bordões acima, que são o verdadeiro objetivo deste texto.


Desde o século passado critico as novelas globais pelo modo como tentam forçar a aceitação de comportamentos alheios ao sentimento e aos valores da nossa cultura. A última novela que acompanhei assiduamente foi Bebê a Bordo, em 1989. Tive poucas e rarefeitas recaídas de lá para cá, libertando-me definitivamente depois que meu filho nasceu, em 2013.


Quando Zorra Total se tornou o humorístico padrão da Globo, também abandonei esse departamento. Os filmes, cada vez menos interessantes por causa da concorrência da TV por assinatura e dos canais de streaming, não me divertem desde que percebi como são esquartejados para caberem na grade da emissora. Com orgulho exibo a marca de nunca jamais em tempo algum ter dedicado sequer 10 segundos do meu tempo para ver ou mesmo comentar o infame Big Brother. Enfim, eliminando uma a uma as atrações bizarras e indecentes, sobraram apenas o noticiário e os esportes. É verdade que eventualmente ainda assisto a futebol na emissora, mas pelo menos nesse departamento ela é praticamente inofensiva no que diz respeito a agressões a meu sentimento moral e à minha capacidade de ver o mundo com lógica e discernimento.


Resta falar do noticiário. Os jornais da emissora sempre tiveram uma linha editorial em consonância com a estratégia da empresa, que a meu ver seria a de manter ótimas relações com quem detivesse o poder político, quem quer que fosse. Até mesmo os petistas, que insistem na palavra de ordem “Globo golpista”, tiveram a emissora como parceira em seus governos até poucos meses antes do impeachment de Dilma. A operação Lava Jato, por exemplo, demorou a ganhar destaque nos seus noticiários. Só aconteceu quando já era inevitável, quando já era impossível esconder o bode na sala, por assim dizer. As manifestações populares contra o partido no poder sempre foram tratadas com desdém. Por tudo isso, apesar da mal dissimulada campanha contra o candidato Bolsonaro, eu afirmei muitas vezes que após as eleições tudo voltaria ao normal: a Globo de braços dados com o poder. Entretanto, minha previsão falhou rotundamente. E, à medida que o seu jornalismo se tornou não apenas militante, mas raivoso, infiel à verdade e desconectado de qualquer bom senso, também me desliguei dos últimos frágeis laços que ainda mantinha com a emissora.


Apesar disso tudo, eu nunca fiz coro para cantar qualquer dos refrões contra a Refe Globo. Não porque guarde alguma simpatia por ela. O que acontece é que justamente os que cantam refrões são os mesmos que dão audiência para a emissora que criticam. Eu não faria parte disso. Não sairia gritando “Globolixo!”, “Globolixo!”, ao lado de comentaristas amadores do BBB. Muito menos me afinaria para cantar “O povo não é bobo...” quando o coral consome sem questionar a campanha de aterrorização levada a cabo tendo como objeto o vírus que veio daquele país oriental.


Pois então é isso, meu leitor ocasional, exatamente esse é o ponto que eu queria tocar. Não se encontra fora da emissora quem a defenda. Pelo contrário, o sentimento comum é que ela é perniciosa, cada um dará seus motivos, mas todos concordarão no final. E no entanto – que surpresa! – ela foi elevada ao grau máximo da sabedoria e da ciência ao se tratar da suposta pandemia. Do alto desse título quase místico, com seus noticiários e com o prestígio de suas estrelas, ela tem ditado o grau de histeria que o povo deve alcançar. Fique em casa, use máscara, mortes, mortes, mortes, não questione se as mortes são mesmo por covid, remédio não serve e quem disser que serve é um herege, vacina serve mas continue em casa por motivos mil que vão continuar inventando, desemprego não temos nada a ver com isso a culpa é do governo e, como antes anunciavam sua próxima atração, agora anunciam segunda onda, terceira onda, nova cepa mais letal, vamos todos morrer se não seguirmos as sábias diretrizes que nos prendem e sufocam.


E assim, a rejeitada emissora é recebida diariamente em tantos lares que mansamente lhe franqueiam suas consciências para que ela plante medo e histeria. “O povo não é bobo...” Será mesmo?

O maior Sete de Setembro de todos

 Estou escrevendo na noite do dia sete de setembro de dois mil e vinte e um. Não sei o que acontecerá amanhã. Sei que do que ocorrerá nos pr...